CARTA DE SÃO
PAULO
No evento realizado no dia 26 de
agosto na sede da ACIMAR – Entidade Nacional dos Civis e Militares, em São
Paulo, os participantes, após debates temáticos, extraíram a seguinte carta:
O
ano de 2015 sugeria aos militares perseguidos pelo golpe Civil–militar de 1964,
um calendário repleto de comemorações, pautado na expectativa de que finalmente
seriam efetivadas conquistas reivindicadas em décadas de lutas relacionadas a
anistia; mas que igualmente confluiria no entendimento que caminhávamos a
passos seguros para um efetivo Estado Democrático de Direito. Essa compreensão
era fortalecida pela reeleição de uma presidente cuja biografia estava
associada a histórica luta contra o golpe civil – militar de 1964, tendo a
causa maior, a anistia e redemocratização.
Dado o fato de que a sociedade vivencia um
ciclo de democracia sem precedente na história do Brasil, a expectativa veio ao
encontro com a entrega do Relatório Final da CNV - Comissão Nacional da Verdade
em 2014, emergindo na tese de que o documento seria o epílogo de uma longa
transição política.
Ao
final, a semana de eventos nacionais em memória
aos 36 anos da anistia em 2015, coroaria esses históricos esforços de remissão
da nação com seus filhos com a expectativa de que as recomendações da CNV
seriam implementadas, assegurando uma cidadania plena até hoje negada aos
militares anistiados.
Todavia,
a avaliação decorrente em muitos fóruns é que há em curso uma política de
retrocesso, até mesmo das conquistas parciais das anistias, e que não escapa,
inclusive, a anistia limitada dos militares. A agenda prepositiva da CNV, por
exemplo, não teve a devida acolhida institucional na agenda governamental,
aliás, vemos o contrário.
Além das recomendações se traduzirem até o
momento em letra morta, sem nenhuma expectativa de seu cumprimento a curto ou
médio prazo, ou que tenha continuidade a longo prazo (a exemplo de comissões da
verdade de outros países) na agenda nacional, essa quase exclusão ou no limite,
a não priorização dessa questão que é de um princípio elementar de cidadania,
significou concretamente a possibilidade que o triste legado advindo de 1964
não venha a ser concluído. E talvez nem seja a intenção.
Os militares perseguidos têm visto com enorme
preocupação, que conquistas e direitos até então assegurados, passaram a ser
questionados judicialmente por iniciativas de vários setores governamentais, em
grande medida, por pressão das Forças Armadas (Exemplo: desanistia do Capitão Lamarca, precedente perigoso).
O resultado mais evidente dessa
política, é que está em curso um processo de desanistia aos militares. Se a
anistia aos militares é incompleta, após a promulgação da Lei n 10.559/02, cujo
objetivo maior era ser um instrumento meramente regulatório do art. 8º do
ADCT/88, em relação às anistias promulgadas a
exemplo de outras anistias ocorridas, como a revolta de Aragarças e
Jacaré-a-canga, no Pará (Santarém), no
início do Governo Juscelino Kubtchek pelos então Major Haroldo Veloso, Capitão
Lameirão e outros e ainda foram agraciados com promoções, bem como, a anistia
concedida ao pai do General João Baptista de Figueiredo, General Euclydes de
Figueiredo, sem qualquer distinção ou prejuízo de ser discriminado como “militar anistiado”, nos mesmos moldes do
enunciado do eminente brasileiro, RUI BARBOSA, de saudosa memória, que honrou a
nossa pátria, com os seguintes dizeres: “ A anistia é por excelência, a expressão perfeita do direito adquirido. A
anistia não se retrata. Concedida, é irretratável. É definitiva, perpétua,
irreformável. Concedida, é irrenunciável. Quem a recebe, não pode rejeitar,
como quem a liberalizou, não a pode subtrair”. (Fonte: No magistério de Rui
Barbosa, no Artigo Intitulado “Via Crucis” dos Anistiados)
Quem
recebe, não a pode rejeitar, como quem liberalizou, não a pode subtrair” a
partir dele, com uma interpretação jurídica enviesada da AGU – Advocacia Geral
da União, contrariando inclusive às
próprias normas desse dispositivo constitucional ((Regime Jurídico
próprio), houve a leitura absurda de que “esses
anistiados não eram mais militares”, regidos por seu regime jurídico
próprio (estatutos originais), e vinculado às suas corporações, com plenos
direitos enquanto militares; confrontando inclusive, o espírito conciliador da
anistia.
Consequentemente,
além do aprofundamento da discriminação entre esses militares e suas
instituições, o resultado dessa política refletiu no questionamento e mesmo
perda de direitos até então consagrados, por exemplo, as promoções e a pensão
militar.
Medidas
recentes promulgadas pelo Ministério da Defesa, adotadas equivocadamente até
pelo STF, vieram lamentavelmente, ao encontro
dessa política de exclusão e discriminação. Por essa razão, lembrando o 36º
Aniversário os participantes de entidades de militares que subscrevem esta
carta e que lutam pela anistia ampla e geral aos militares, conclamam as demais
entidades e setores da sociedade civil em confluir esforços na construção de
uma agenda nacional no sentido de reverter essas políticas discriminatórias, e
buscar o efetivo cumprimento da lei de anistia, cujos princípios devem estar
pautados na segurança jurídica do processo de anistia, não se permitindo o
seu flexionamento, ao bel-prazer dos
inconformados enquistados no Poder.
Devemos
ter inclusive a consciência das recomendações de organizações internacionais às
quais o Brasil é signatário, como a Corte Interamericana de Direitos do Homem,
e nesse esforço conjunto, a implementação das recomendações da Comissão Nacional
da Verdade. Assinam a presente carta:
ACIMAR/SP – Entidade Nacional dos
Civis e Militares Aposentados e da Reserva
UMNA/RJ – Unidade de Mobilização
Nacional pela Anistia.
AMPLA/RS – Associação de Defesa dos
Direitos e Pró-Anistia “AMPLA” dos Atingidos por Atos Institucionais.
AMAESP/SP – Associação dos Militares
Anistiados do Estado de São Paulo.
AMAFABRA – Associação dos Militares
Anistiados e Anistiandos das FFAA do Brasil.
EDITORA CORTEZ/SP. JOSÉ XAVIER CORTEZ
(Presidente)